sábado, 30 de abril de 2011

INTENSA FOME DE VIVER

O que houve, Rospo? Parece pensativo...
— É a intensa fome, Sapabela...
— Não diga, quer que eu faça rabanadas? Tenho pão...
— Sapabela, obrigado, mas é a intensa fome de viver...
— Sei como é, Rospo. E numa noite assim de Outono isso fica angustiante...
— Olho para a imensidão, o risco cacheado das luzes que as estrelas salpicam...
— Você precisa ir pra longe, para outros lugares... Aprenda a bendizer o seu dom de voar... Seja cada vez mais alto, rompa os horizontes...
— Esse é o equívoco, Sapabela.
— Nem sabia que tinha um equívoco.
— Não precisa ir para longe, não preciso ir para nenhum lugar... A intensa fome de viver não condiciona em si a necessidade de deslocamento, de viagens, de mudanças... Ela basta a si e se sacia exatamente aqui, pois aqui é onde estamos...
— Concordo Rospo, aqui é o lugar.
— Sim, Sapabela, estar faz o lugar.
— Rospo, então vamos saciar essa intensa fome de viver. Por onde começar?
— Isso me fez pensar numa gravidade medonha que as mães faziam aos pequenos...
— Do que fala, Rospo?
— Ter horário para dormir...
— Mas na vida tem que ter regras...
— Eu também tinha que fazer isso, ir para cama tal hora...
— E qual o problema, Rospo?
— Eu ia para a cama antes do sono...Tinha que ir sem ele...
— Mas depois cresce, tem que cumprir horário...
 — Isso é terrível... Talvez seja a causa da angústia...
— Pode ser, mas tente começar, Rospo. Algo pode ser feito para que a fome de viver seja saciada.
— Saciada não sei, mas tenho que ser muito atencioso com ela... Pois ela não suporta passividade, marasmo...
— Então, vamos, amigo, vamos. Por onde começar?
— Viver é estar intensamente vinculado com o mundo, conectado e participando das dores e das festas do mundo...
— Isso é possível, Rospo? Fazer uma assinatura de jornal é muito pouco...
— Só quando o mundo estiver em nós é que estaremos em harmonia com a intensa fome de viver.


HISTÓRIAS DO ROSPO 2011 — 558
Marciano Vasques
Leia CIANO

O "BATISMO"

ELA INVADIU A CASA AZUL

AH, SE EU VOU!

O SÁBADO É DELA

COMENTANDO A POESIA DA CASA

Por um triz voei... porque podemos ter 
a invenção de pássaros na alma!!!

Jovilson Carvalho
Jornalista

HOJE É SÁBADO!

MAIS ALGUÉM

BREVIDADES



BREVIDADES


Tudo era feliz...
O anis
O anil
o anel
     Até a flor de lis que eu, 
                  quase por um triz, 
                                         toquei.
Ouvi Elvis,
            Elis...
               
Fui mais feliz...
Sem amores vis...

Mas...  

Ouça agora o que ele diz:

     Quando a  conheci
     Logo pensei:
    Que atriz!

       Mas hoje, sem você:
                     cicatriz atroz!


MARCIANO VASQUES

INVENTORES

Foi o homem que inventou o alçapão.
Passarinho só inventa voo.

Marciano Vasques

Para o Mário Quintana

BELEZA E LEVEZA

MAMBEMBE

RIOHARP FESTIVAL


Veja AQUI

LÉLIA ABRAMO

REMOER NÃO, REMOVER SIM

— Varrer os porões da mente e organizar o lazer... Faz tempo que não fala isso, Rospo...
— Então vamos falar... Aproveitar que a garapa está gelada e gostosa que outono só...
— Então fale.
— Varrer os porões da mente é justamente retirar os entulhos, e tudo aquilo que precisa ser removido, pois está atrapalhando o compasso e erguendo barreiras para o fluir da vida...
— Não é fácil, Rospo, pois requer disposição...
— Mas é a única saída... Veja que esses entulhos causam um desmanche na alma. O caboclo fica cansado, sem ideias novas, embotado de problemas...
— Como um sujeito deve remover os entulhos da mente?
— O slogan seria: REMOER NÃO! REMOVER SIM!
— Muito bem, mas a vida não é feita de slogan...
— Justamente, Sapabela. A vida é feita de decisões. E o primeiro passo para o sapo é parar de ficar se remoendo. Pois depois de moer algumas vezes, a sua alma fica cansada. Nem moer nem remoer...Mas apenas remover. Ora, se necessita de decisão, pois então que se decida a decisão...
— Não é tão fácil, Rospo!
— Ainda bem. Se fosse, nem teria graça. O sujeito deve buscar a vassoura e começar a remover os entulhos logo num sábado de manhã...
— Mas e se a vassoura não bastar?
— Melhor ainda, use uma enxada, e se for pouco, vá logo de trator...
— Trator?
— Sim, Sapabela. Não importa qual seja a ferramenta, o instrumento... O importante é remover os pensamentos improdutivos, as ideias preconceituosas sedimentadas ao longo do cotidiano, os pânicos...
— Pânicos?
— Sim,  medos descabidos.
— E então?
— E então organizar o lazer...
— E o que seria isso?
— Seria renovar o repertório musical e de conversas, mapear os quereres, organizar o cinema, listar os livros que precisam ser lidos... Enfim, essa parte é fácil. O importante é o sujeito estar disposto a remover os entulhos mentais...
— Será que eu preciso também fazer isso?
— Ora, Sapabela, que pretensão de cada um querer acreditar que sua mente é Zero...
— Zero?
— É, desprovida de ideias que atrapalham, de ganchos preconceituosos que vieram da infância, de piadas que foram ouvidas, de conversas temerosas...  Até mesmo apenas um grãozinho deve ser retirado...Só assim, a mente estará mais limpa que vidraça de janela após a chuva...


HISTÓRIAS DO ROSPO 2011 — 557
Marciano Vasques
Leia CIANO

CANTADOR NORDESTINO

Sebastião Marinho


ROMEU E JULIETA EM CORDEL

PINGO DE FORTALEZA

VENHA DE BRANCO!

sexta-feira, 29 de abril de 2011

O VENDEDOR DE AFETOS

— Sapabela, decidi me tornar comerciante, empresário...
— Você, Rospo? Não me faça rir, ou melhor, faça, e essa ideia, inusitada, exótica, e impossível, só me fará rir. O que venderá? A sua coleção de gibis da infância? Diga, meu amigo, confesso-me curiosa...
— Decidi pôr no mercado um artigo um pouco raro... Algo que sinto que anda em falta... Percebo isso na escassez de abraços, no excesso de pressa e de falta de atenção...
— O que você vai afinal vender, meu amigo?
— Afeto.
— Não disse? Você não tem vocação para empresário. Vai à falência. Escolheu um produto que irá falir você... Afeto? Ora, é muito engraçado, é muito divertido. Não consigo parar de rir, vou gargalhar três dias sem parar... Não posso parar. Eu não consigo parar de rir, Rospo. KKKKKKKKKKKKK
— Você também ri assim?
— KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK
— Sapabela, pare com isso! Que ridículo! Parece risada de Internet!
— Não posso, Rospo! É muito engraçado! Vou rolar no chão, de tanto rir...
— Rolar no chão? Isso eu gostei. Com esse vestidinho...
— KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK
— Pronto. A história não tem mais argumento. Chega de rir, Sapabela.
— Sabe o que é, Rospo?
— Diga.
—  KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK
— Estou perdido.
— Falência antes de começar...
— Ora, Sapabela...
— O que você vai pedir? Concordata?
— Eu nem sei o que é isso...
— Existe cultura na economia, meu amigo...
— Sapabela, você está exagerando...
— Ora, Rospo, você vai vender artigo de luxo? Afeto? KKKKKKKKKKKKKKKKKK
— Começou outra vez.
— É muito engraçado, Rospo.
— Só se for para você. A comunidade do brejo anda carente de afeto. Vai fazer o maior sucesso...
—Ora, Rospo, se for vender enlatado, faça promoções. Ofereça de brinde o abridor, compre uma lata e ganhe dez...
— Você está desmoralizando o meu negócio antes de ele começar...
— Afeto? Ninguém vai comprar, o pessoal, a maioria, não quer nem de graça...
— Sapabela, como você me incentiva...
— É que achei muito engraçado. Um sapo inaugura um armazém de afetos... KKKKKKKKKKKKKKKKKKK
— Sapabela, vamos tomar uma garapa, bem gelada? Já pensou: um caldo de cana e uma caminhada na calçada...
— Viu só, Rospo? É de graça, está disponível, e você vai querer vender? Para com isso. Quem quiser afeto é só aprumar o coração, erguer os olhos, abrir os braços... Tudo é tão simples... Você por acaso pensou que iria ficar rico? Pensou que formaria uma rede? Que se tornaria um empresário pioneiro? Ora, Rospo, que ideia mais estaparfúdia! Afeto está por aí, em todos os cantos e recantos. Quem quiser é só se deixar levar.
— Eu sei, Sapabela, afeto não dói. É que eu pensei que estivesse em falta e...
— Não está em falta, Rospo. Os sapos é que não prestam atenção nem querem... Posso mais um pouquinho?
— Um pouqinho do quê?
— KKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKKK
— Ridículo. Mas, vamos ao nosso caldo de cana, que afinal, neste sábado, uma sapabela ao meu lado é a melhor forma de cumprimentar o sol...
— Hoje é sexta, Rospo.
— É que já sinto pairar no ar o sábado...
— Sei, o afeto do sol, do vento, do azul, da claridade do dia...

 HISTÓRIAS DO ROSPO 2011 — 556
Marciano Vasques
Leia CIANO

A FLOR DO SÁBADO CHUVOSO

A FLOR DO SÁBADO CHUVOSO
 
 
 A flor do sabugueiro. Essa flor eu vi. O branco enfeitando em arte a árvore. O coração chora às vezes, e quando isso acontece alcança a poesia que dança ao redor, que esteve desde que me tornei assim.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

SOBRE DONS E TALENTOS

— Rospo, como a garapa ainda não acabou, quero falar só um pouquinho daquele assunto.
— Claro, Sapabela. Claro.
— Você, com suas provocações, me fez pensar em algo: o talento é uma coisa nata ou se desenvolve, ou melhor, surge durante a vida?
— O talento se desenvolve por aperfeiçoamento, por dedicação, por persistência, por esmerilho, por esforço e técnica, aperfeiçoada com o treino constante e incessante, com o fazer, a oficina pessoal de cada um... Somos oficinas ambulantes com abundância de poesia desprezada na maioria dos casos...
— O dom existe?
— Dom e talento podem ser sinônimos, naturalmente. Claro que tem sapo que nasce com o dom, mas isso nada significará se ele não se aperfeiçoar... Um músico, por exemplo, ou seja, um sapo que já nasce com o dom da música, de que adiantará isso, se ele viver a vida inteira num ambiente rústico e não for direcionado para a música? Da mesma forma, um escritor, um poeta, que já nasce com o dom da literatura, de que lhe servirá isso se diante dele jamais um livro for posto? Para escrever tem que ter sido seduzido pelo amor das letras...
— Por hipótese, poderíamos dizer que todos são talentosos?
— Quando se fala em talento se pensa imediatamente na arte, mas a sapa que faz o tempero, que tempera, que faz um bolo, um doce, bota talento nisso...
— Então, todos podem nascer com um determinado dom, mas é a vida que irá decidir...
— Cada qual terá que saber a chance que a vida oferecerá, pois só ela, a vida irá favorecer o favo do florescimento do talento, ou seja, do dom. Quando um sapo perde a oportunidade de vislumbrar os seus caminhos, de todo talento pode se dizer que tá lento.


HISTÓRIAS DO ROSPO  2011 — 555
Marciano Vasques

Leia CIANO

UMA TAL FORTALEZA...

Como é difícil se abrir para o outro!
— Com certeza, Rospo.
— Em se tratando de poetas, de literatura, é mais difícil ainda...
— Quer falar sobre isso?
— Só se for com uma garapa...
— Adoro caldo de cana. Garapa me lembra dos meus dias de garupa nos caminhões da vila. Mas será que não corremos o risco de ficarmos mais verdes?
— Na verdade, você é rosa...
— São seus olhos, mas fale da dificuldade de se abrir para o outro...
— É muito difícil um poeta, um candidato a uma vaga nesse universo tão complexo, elogiar despretensiosamente o outro, inclusive quando o outro é bem mais talentoso, pois isso acontece, às vezes, de um poeta ser mais talentoso do que o outro. É também muito difícil, para a maioria, dizer ao outro: — Olhe, o seu trabalho é bom, é muito bom mesmo. Parabéns! — E inclusive, divulgar o outro. De certo modo, cada qual quer mesmo saber e cuidar de si... Nos encontros têm toda uma chuva de confetes, elogios de boca, mas fica tudo por ali. Naturalmente que encontramos sempre uns ou outros sapos com a alma aberta, que destoam da multidão, esses têm o coração de amigo... Esses são os que diferem, que devemos adicionar em nossa vida real, como amigos e como aqueles que estão além do que se condicionou ser aquilo que deveria alguém se pronunciar no mundo... Ou seja, as presenças são pronúncias do ser.
— Continue, Rospo... Já que você gosta mesmo de assuntos espinhosos...
— Sapabela, você fica dando corda, fica dando linha, empinando a conversa, como se os ventos fossem sempre favoráveis...
— Dar linha é o requisito essencial, Rospo...
— Pois bem, geralmente os sapos que escrevem, não todos, claro, mas a maioria, procura se esconder num silêncio altamente revelador... diante da obra de um parceiro, um contemporâneo...
— Por que "altamente revelador", Rospo?
— Pois revela o maior dos aplausos, que é o aplauso do silêncio...
— Você já andou falando sobre isso, Rospo... Por quê insistir nesse assunto?
— Por que devemos decifrar o espírito da época...
— Ou da alma?
— É, pode ser.
— Não precisamos nos preocupar com essas coisas, Rospo. O importante é deixar a poesia fluir, cada vez mais cristalina, mais autêntica, mais sincera, mais transparente, mais lúcida, mais lapidada...
— Falando nisso, vamos lavar nossos rostos no riacho da poesia?
— Vamos! Já estou indo!
— Assim nossos corações se expandirão cada vez mais...
— Esse é o meu Rospo!
— E cada aplauso silencioso será um novo tijolo nessa fortaleza...
— Fortaleza?
— Sim, a fortaleza da poesia...
— E onde está essa fortaleza, Rospo?
— Na vida, nas ruas, no capim roçado pela ventania, no azulão de uma tarde de vidro transparente, num sol que clama cigarras, nos aromas de uma profusão de vidas, vidas que se entornam, se esparramam...
Aromas de anis, de bolos sem enfeites e sem glacês na felicidade de mil olhos infantis...
— Entendi, a poesia está aí, é so recolhê-la... Mas, essa conversa tergiversou...
— Pode até tergiversar, desde que tenha versado. É assim mesmo... A conversa é feita de laços que se expandem numa suave leveza...
— Moço! Dois copos de garapa!
— Nem precisam pedir, já estão aqui, prontinhos, com cubos de gelo...
— Como sabia que pediríamos?
— Ora, quem não conhece vocês dois?


HISTÓRIAS DO ROSPO 2011 — 553
Marciano Vasques
Leia CIANO

quarta-feira, 27 de abril de 2011

GARAPAS E CONVERSAS

Rospo observava três sapos discutindo.
— Nada como apreciar a minha garapa ouvindo uma conversa boa.
Então, o nosso amigo se deu conta de que os três sapos estavam encenando uma peça... Ou melhor dizendo, estavam decorando um texto.
— Eu sou a razão! — Dizia um, serenamente.
— Eu sou a inteligência! — Afirmava o outro, empolgado.
— Eu sou a esperteza ! — respondia o terceiro, entusiasmado.
— A razão impede as atrocidades, e toda estupidez... — retomava o primeiro, orgulhoso.
— A inteligência edificou o mundo tal como ele é  — prosseguiu o seguinte.
— A esperteza me faz chegar sempre na frente. — finalizou o último, esnobando.

— "Que conversa deliciosa! É conversa de garapa!" — pensou nosso Rospo, quando ouviu uma voz.
— Quero um copo de garapa bem gelado, com pedras de gelo. Vou acompanhar esse sapo...
— Sapabela, que surpresa! É a nossa primeira garapa no Outono...
— Claro, precisamos dar uma breve folga para o sorvete.
— Está vendo aqueles três?
Formam um trio que ainda confunde muita gente. A inteligência, a razão e a esperteza...
— Mas pode acreditar, Rospo, são coisas bem diferentes.
— Você tem razão, Sapabela.
— Lógico. E sou esperta. Quando vi você fui logo na garapa...
— É inteligente, né. O que admiro em você é que a sua esperteza é para o bem...
— Sempre, Rospo. Às vezes, quando vemos uma injustiça, temos que ser rápidos no gatilho. Agir com esperteza e velocidade na denúncia...
— E sempre impulsionados pela razão.
— Que garapa boa, Rospo!
— Isso me faz pensar: como eu queria correr num canavial...
— Canavial, canavial, onde estás afinal?
— Sapabela, vamos caminhar?
— Isso foi uma esperteza.
— Por que?
— Percebeu a brisa suave e agiu na ligeireza... Pra sentir no rosto a tal...
— Não me faça rir, Sapabela.
— Faço sim, meu amigo, faço sim.


HISTÓRIAS DO ROSPO 2011 —552
Marciano Vasques
Leia em CIANO

NO AR, PALAVRA FIANDEIRA

NOVA EDIÇÃO DE PALAVRA FIANDEIRA!
PALAVRA FIANDEIRA APRESENTA:
ÂNGELA LEITE DE SOUZA


SAPABELA É CIUMENTA?

— Sapabela, a minha amiga Anésia é fora de série...
— Com certeza...
— Sempre costumo dizer: "O Brejo não precisa de amnésia, precisa de Anésia"...
— Que interessante, Rospo...
— Ela gosta muito de brincadeiras...
— Vai  brincando...
— Veja, Sapabela! Uma aranha!
— Tem medo de aranha, Rospo?
— Depende da aranha...
— Sei...
— Mas tem aranha venenosa, dizem que a tarântula...
— Já li que elas são inofensivas...
— Entende de aranhas, Sapabela?
— Não! Nem pensar.
— Elas me causam um certo receio...
— Pavor, Rospo...
— Nem tanto, apenas sou meio prevenido... Essa aranha, que está passando, veja como ela tem uma aparência ameaçadora...
— É bom evitar.
— Cobras, escorpiões, aranhas... Sempre é bom se precaver...
— Entendo.
— Você é tão generosa, Sapabela.
— Vai pensando...
— A minha amiga Anésia gosta de botânica e também de estudar os insetos...
— Bem, Rospo, preciso ir. Tchau!

À noite, a Sapabela liga para o Rospo.
— Alô!
—Olá, Sapabela, que saudades!
— Rospo, aquela aranha ainda não engoliu você?
— Claro que não, Sapabela! Que conversa boba...
— Aranha mole!


HISTÓRIAS DO ROSPO 2011 — 551
Marciano Vasques
Leia CIANO

terça-feira, 26 de abril de 2011

DIZEM...

Dizem que um poeta morreu...

Lá está ele!


FALANDO EM POETA...

Saudades de você, poeta...

Eugénio de Andrade, poeta português

TULIPAS

Numa segunda-feira um poeta morreu...

Em Ottawa, no Canadá, o lindo e esplendoroso festival de tulipas.
No ar, revoada de blogs como estrelas luzindo acenando manhãs, ... e gafanhotos saltitam, riscam o azul de vidro claro...
E a vida prossegue e se faz rogo, se faz pão quente que a quentura das mãos em rugas amassam... 
E no planeta a plena tulipa diz que a vida não tem jeito...
Marciano Vasques


Foto: Cíntia Reinaux

NUMA MANHÃ DE SEGUNDA - FEIRA


Morreu ontem o  poeta chileno
Gonzalo Rojas!


FRAGMENTOS

“Na maior parte do planeta, as mulheres são tratadas pior que nas letras de tango”.  
(...)

"Isso que chamamos curiosamente de violência doméstica e que consiste na forma mais repulsiva do exercício de direito de propriedade, que é o direito de propriedade entre pessoas. Direito de propriedade que o macho se atribui sobre a fêmea."
 (...)

"Porque a violência do homem é o espelho do medo do homem de uma mulher sem medo. "

Fragmentos de uma recente entrevista do escritor uruguaio Eduardo Galeano, autor de  "As Veias Abertas da América Latina"

segunda-feira, 25 de abril de 2011

ALMAS NAQUELA CALÇADA

— Rospo, preciso ir, tenho compromisso...
 Cumpro horário, você sabe. Trabalho é trabalho.
— Está gostando do seu novo emprego?
— Trabalho com crianças, e os sapinhos e as sapinhas, sapequinhas, me emocionam... Mas fiquei pensando algo...
— No que pensou, Sapabela?
— Que o beijo não tem fronteiras...
— Beijo é beijo, não é, minha amiga?
— Pois é, a minha boca não tem limites... E o meu beijo não tem juízo...
— Está inspirada hoje, Sapabela?
— É por que chegou o mês dos namorados...
— Nem entramos em Maio ainda... E você já está pensando em Junho?
— Essa vida apressada nos tira o juízo...
— Tira não, põe.Ou melhor, não põe, pois pôr seria tirar... Quero dizer, o que falta é falta de juízo naqueles que se amam...
— Sabe, Rospo, o beijo é um andarilho, um poeta, um bêbado repleto de...
— Luzes!!!
— Não, de uma luz só, intensa, que vem do coração... Lá do reino do "se diz seduz..."
— Então, tem mesmo é que beijar...
— Preciso é encontrar um namorado primeiro...
— Às vezes o que parece tão distante, que a vista nem alcança...
— Chegou o ônibus. Tchau, meu querido! Tchau!
— ... Está tão próximo, ao nosso lado... Bem, ela não ouviu...

E Rospo vai pela calçada pensando na falta de juízo dos namorantes e dos poetas embevecidos da aventura de viver, que faltam num mundo tão certinho onde a pressa é apenas a ponta de uma engrenagem sufocante que aliena e põe na calçada do esquecimento as almas que chovem de anseios.


HISTÓRIAS DO ROSPO 2011 — 550
Marciano Vasques
Leia CIANO

domingo, 24 de abril de 2011

BREVEMENTE O CONVITE DE LANÇAMENTO

PÁSCOA 7 — FELICIDADE

PÁSCOA 6 — FOI DEUS

PÁSCOA 5 — PAZ DO MEU AMOR / MENINO PASSARINHO

PÁSCOA 4 — EU, A VIOLA E DEUS

PÁSCOA 3 — CUITELINHO

PÁSCOA 2 — CÁLIX BENTO

PÁSCOA 1 — O CIO DA TERRA

O INFINITO ESPETÁCULO

— Um grande espetáculo! Quero falar sobre ele.
— Pois fale, minha linda. Nem sabia que tinha um chegado um circo aqui no brejo...
— Quem falou em circo?
— Você falou em espetáculo!
— Sim, um imenso festival, de exigências, de quereres...
— E onde você viu isso, Sapabela?
— Na minha infância.
— Entendi, como hoje, com os sapinhos e as sapinhas, que querem cada vez mais brinquedos... A infância virou um grande mercantilismo, para o capitalismo, claro... Os brinquedos cada vez mais caros...
— Rospo, não precisa esse discurso agora. O grande espetáculo da minha infância, o tal festival, foi de perguntas, foi de caça ao tesouro, muitas e muitas vezes, o tesouro do saber, do conhecimento, dos mistérios da vida. Fui uma sapinha completa, ou seja, rica de perguntas. Fui a sapinha mais curiosa do mundo. Adorava perguntar, e ler, li vários livros, alguns de aventuras inesquecíveis, adorava quando alguém dizia que não era para a minha idade, assim, quando eu tinha nove anos, alguém disse, é só para sapinhas de quinze anos. Devorei o livro, Rospo, escondida!
— Também fui um "rato de biblioteca"...
— Rato? Eu fui uma flor de biblioteca, Rospo! Uma flor sedenta e insaciável. O conhecimento era o meu companheiro inseparável, e brincávamos de esconde-esconde, ou seja, se não o encontrava num livro, ele surgia num filme... Sempre adorei essa brincadeira. Tive uma infância feliz, Rospo. Fui realmente a dona do espetáculo. Não o desperdicei jamais. Hoje eu aplaudo, e os aplausos são para mim. Eu fui a criança completa, a criança repleta de perguntas.
—Você sempre há de me emocionar, Sapabela. Por isso a nossa amizade se  fortalece a cada dia...
— E vou contar um segredo. Sou muito exigente. Exijo qualidade nas minhas escolhas... Por isso me sinto privilegiada.
— Como assim, Sapabela?
— Pensa que é fácil encontrar um Rospo?
— Sapabela, vamos parar com esse "rasgar de seda". Que tal um sorvete?
— É Páscoa, Rospo! Só pode ser sabor de chocolate.


HISTÓRIAS DO ROSPO 2011 — 549
Marciano Vasques
Leia CIANO

AQUILO QUE O TEMPO NÃO LEVA

— Curioso, Rospo!
— O que é curioso, Sapabela?
— O sapo ergueu templos, bibliotecas, suntuosos teatros através dos tempos...
— Isso me emociona.
— Mas tudo sucumbiu.
— Como é?
— Calma, Rospo! Deixe-me explicar pausadamente...
— Levei um susto...
— Eu quis dizer que templos são demolidos e outros são construídos, suntuosas edificações são erguidas e depois, nos séculos e séculos sofrem o efeito da erosão e muitas vão ao chão, em ruínas...
— Naturalmente.
— Mas tem algo que o sapo edificou e que jamais foi destruído, e atravessa o tempo na íntegra, embora de aparência frágil, pois até se diz que o vento leva...
— Que coisa é essa, Sapabela, que não vem abaixo? Que não se extingue com a erosão do tempo?
— Simples.
— Sem suspense, diga, minha amiga... Pois se até templos e edifícios gigantes são destruídos...
— É a palavra, Rospo. A palavra escrita, a palavra no papel, pode o tempo passar que ela continua firme e intacta, rompe séculos e séculos... É a única coisa que o tempo não leva.


HISTÓRIAS DO ROSPO 2011 — 548
Marciano Vasques
Leia CIANO

AS DIFERENÇAS NÃO TÃO DIFERENTES

— Sapabela, minha amiga Anésia leva tudo na brincadeira...
— Essa sabe viver.
— Mandou-se um cartão de Páscoa com uma mensagem curiosa: Pra eu comer os ovos de chocolate e aproveitar e comer os coelhos e as coelhas...
— Muito engraçadinha essa sua Anésia...
— Falando em amigas, viu como tem umas sapas inteligentes deixando comentários em meu frogblog?
— Reparei...
— Não sabia que se interessava pelos comentários, Sapabela, pensei que gostasse apenas do conteúdo das postagens...
— Pois é.
— Tenho uma amiga que sempre que chove ela faz sol... Quer dizer, ela pega um livro pra ler. Ouve música...
— Entendi. Tome, Rospo. Estou indo. Tchau!
— Um cartão? Obrigado! Um cartão de Páscoa! Minha amiga RB também me enviou um... Precisa ver que bonito! Sapabela? Bem, ela já se foi. Deve ter algum compromisso... Deixe-me ler a mensagem do cartão.

E o Rospo lê: "Não me fale das suas amigas!!!"
— Sapas... Bem, Sapabela é diferente de todas as sapas que eu conheço, mas não exagerou na diferença. Quando chegar em casa, vou ligar para ela.

Mais tarde...

— Sapabela, liguei várias vezes e você não atendeu. O telefone só dava ocupado.
— Estava conversando com um amigo...
— Amigo??? Amigo???!!! Que amigo???


HISTÓRIAS DO ROSPO 2011 — 547
Marciano Vasques
Leia CIANO

O EXORCISMO ATRÁS DA PADARIA

Que pequena aglomeração é aquela nos fundos da padaria, Rospo?
— Tem um exorcista lá, um padre que expulsa demônios...
— Sei... Mas o que ele está fazendo lá?
— Tentando expulsar a "coisa ruim"...
— Que "coisa ruim", Rospo?
— Ele. E a pequena multidão vai rezando, orando, dando uma força...
— Ora, eles estão justamente de frente para o local onde fica o forno de fazer pães...
— É justamente por isso que o exorcista está lá... Para expulsar mesmo...
— Rospo, estou entendendo cada vez menos...
— Ora, Sapabela, pense um pouco.
— Pronto. Estou pensando.
— E eu estou esperando.
— Não precisa esperar mais, Rospo. Já sei!
— Você é ligeira, não é?
— Sapabela, meu!
— E então, diga:
— Ora, Rospo. O exorcista está lá justamente porque é lá que se faz o pão, e ele quer expulsar o tal... Justamente porque o povo do brejo vive dizendo que anda comendo o pão que o diabo amassou.
— Supimpa!
— Provocou...


HISTÓRIAS DO ROSPO 2011 — 546
Marciano Vasques
Leia CIANO

A PALAVRA NO MUNDO

— Você aproxima a palavra do seu mundo...
 E a transforma... Além de que ela é filha da época...
— A palavra é filha da época, Rospo?
— Claro! Veja como os jovens se expressavam entre si no passado. As sapinhas se referiam aos sapos rapazes dizendo assim: "Aquele cara é um broto"... Porque a época era de florescimento. A juventude estava desabrochando na década de 60...
— Entendi. Um broto...
— Depois elas diziam assim: "Aquele cara é um pão"... Pois então era a época de pôr a mão na massa...
— Sei, aquele amasso no portão...
— Depois os jovens passaram a ser chamados assim: "Aquele cara é um gato, um gatinho", pois era então a época de animal, de fera...
— E assim também com as meninas, que numa época eram docinhos de coco, na outra, gatinhas... E depois, uma máquina, um avião... E hoje, Rospo, como os moços se referem às meninas?
— Melhor nem falar, Sapabela. Mas sobre isso de as palavras se aproximarem do seu mundo, veja três exemplos. O cérebro virou miolos... Então é comum se dizer que fulano não está bem dos miolos... Pois miolos tem a ver com pão... É a imagem mais próxima do cotidiano, assim como testículos viraram bagos, e bagos, bem sabemos, tem algo a ver com uva... É uma associação entre coisas que transfere a palavra para o mais fácil, mais prático... é mais fácil memorizar e falar bagos do que testículos...
— Tem mais algum exemplo?
— Sim, quando dizem que tal sujeito, que aprontou alguma, é um animal... Dizem: aquele cara é um animal.
— Eis um caso de associação indevida...
— Explique.
— Quando alguém é violento e faz alguma maldade, a ele é atribuído a palavra "animal". Isso é um despropósito, uma ofensa aos animais, que jamais cometem as injustiças e as maldades que só um sapo é capaz de fazer...

HISTÓRIAS DO ROSPO 2011 — 545
Marciano Vasques

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sábado, 23 de abril de 2011

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UM CERTO COELHO ENTRE NÓS

 UM CERTO COELHO ENTRE NÓS
Muitos personagens povoam as mentes infantis. Geralmente derivados das Histórias em Quadrinhos e popularizados pela televisão nas sessões vespertinas. Uma boa parte não acrescenta nada para a criança. Só perseguições, pancadaria, espertezas, safadezas, bobagens e coisas sem sentido e muitas vezes sem lógica. É pássaro levado que está sempre brigando e levando a melhor, é gato perseguindo rato. Enfim. E tem coelho que também nada diz.
Mas como é Páscoa, resolvi falar de um coelho especial. Visto que no espaço lúdico da criança o coelho triunfou, por causa de sua fertilidade, e se tornou um símbolo da Páscoa, para glória e alegria do comércio de chocolate.
E, bem disse a Clarice, toda criança deveria pelo menos uma vez na vida ter um coelho. Eu conheci, tu conheceste, um em nossa infância. E não dá para falar dele sem falar da sua dona, ou seja, da sua criadora. Um encanto de vida. Algumas vidas realmente me encantam, Espinosa, e ela, Beatrix Potter, a criadora de Peter Rabbit. Genial, uma doçura. E viveu numa época difícil para a mulher. Com certeza podemos vasculhar e pesquisar um dia inteiro na busca de encontrar uma época que tenha sido fácil para a mulher, mas ela nasceu no século XIX e viveu uma parte do Século XX, morreu em 1943.
Época em que mulher não podia trabalhar, e menos ainda ser autora de Literatura Infantil. Ser independente? Nem pensar! Mas ela foi, pois o seu espírito era independente, talvez por ter convivido em toda a sua vida com os animaizinhos, entre os quais, os coelhos, e ter sido uma grande e incansável observadora e, um detalhe, atenciosas com os pequenos seres que vivem ao redor da infância. Ela era diferente e destoava de sua época. Amava os animais e até conversava com eles. Por isso seus personagens doces e sensíveis conquistaram o coração da criança de todos os lugares. Pois se não sabem, a criança é universal, pertence a todos os lugares. Escritores que perceberam isso, escreveram obras inesquecíveis.
Peter Rabbit. De vez em quando nós o vemos em sacolas. Mas ele foi o personagem travesso e encantador da obra mais famosa de Beatrix Potter.
Numa época preconceituosa contra a mulher, a autora e ilustradora procurou setenta editoras para tentar publicar o seu primeiro livro. Todas recusaram, pois era difícil naqueles dias para um principiante, um autor desconhecido publicar um livro. As editoras recusavam, e em se tratando de mulher...
Mas em 1902 seu coelho Peter foi publicado. A septuagésima editora aprovou. Viram como vale a pena ser persistente?
Começou a ganhar dinheiro com a venda de seus livros e se tornou próspera, pois bem dizem, coelho dá sorte, por isso que uma certa ignorância prevaleceu durante muito tempo por aí, de se cortar a pata do coelho e, talismã! Vamos, é Páscoa..., vamos só falar de coisas amenas.
Contrariando o espírito dominante da época, ela não queria se casar, mas uma mulher era feita para casar, e era inaceitável para a família uma componente do feminino ganhando dinheiro com seus próprios livros. Que barra! A inglesa Beatrix sofreu, mas jamais desistiu de seu ideal. E emocionou os corações dos pequenos com seu extraordinário coelho.
Dizem que J.K. Rowling deu o sobrenome do seu bruxo porque ela adorava a autora de Peter Rabbit, mas por enquanto é só boato.
Não só os seus coelhos, mas todos os seus personagens animais têm vida, e bota vida, menino!, e têm muita alma.
Se por um lado ela chocou a sociedade e depois a encantou com seu coelho, nada mais justo que agora na Páscoa, ela seja lembrada. E viva Peter Rabbit!
Quer uma vida de beleza? De luta e determinação? Siga essa mulher, a maior escritora de literatura infantil do mundo e de todos os tempos, e abrace o seu coelho. Afinal, é Páscoa.


MARCIANO VASQUES

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