EDUCAR-SE PARA O OUTRO
—Sapabela, talvez seja muito difícil um sapo ser educado para o outro...
—Rospo,
fale disso, por favor. Isso me fez lembrar de um pequeno conto sobre
uma rã que queria ser uma rã autêntica...A história é sobre uma
sapa que só vivia para a opinião dos outros, ela vivia em função
do outro, até que se anulou... É um conto de Augusto Monterroso.
—Não,
Sapabela. Educar-se para o outro... é algo diferente. Não é viver
em função alheia, não é sair de si, não é perder a autonomia,
não é só depender da opinião alheia... Educar-se para o outro é
algo diferente.
—Como
é, Rospo?
—Educar-se
para o outro é mostrar que você existe, que seu espaço está
garantido pela sua autoridade...
—Autoridade?
—Sim,
autoridade tem dois conceitos... Não confunda autoridade com
autoritarismo...
—Entendi.
Um bom médico tem autoridade pelos seus excelentes serviços
prestados... Um professor, um cientista, um sapo da plantação,
pelos seus conhecimentos da terra, um escritor, um político...Uma
sapa caseira pelos seus conhecimentos das ervas, e todos os sapos
que transmitem os conhecimentos de geração para geração...
Autoridade se conquista pela palavra e pelo trabalho... Autoritarismo
se impõe pela força. Uma se alimenta de diálogo, a outra sobrevive
pela insensatez...
—Isso
mesmo. E educar-se para outro é aprender a respeitar o outro, ter
pelo outro um profundo respeito. Saber que o outro é portador da
amizade, e das delicadezas, pois a delicadeza é o bendito fruto da
amizade, é o seu cultivo diário... Educar-se para o outro é
abrir-se como faz o girassol, em direção ao sol que a amizade do
outro produz... Nada a ver com se anular... Nada a ver com perder a
sua liberdade ou o seu espaço. Quando você se abre de forma sincera
e transparente, está se preparando para entrar no rio das águas
claras que só a amizade pode oferecer, de forma generosa e
abundante...
—Isso
é bonito, mas, Rospo, atualmente está meio difícil tudo isso, pois
o mundo já não se importa com essa amizade que você proclama...
—Engano,
Sapabela.
—Nada
como se enganar no sábado.
—Engraçadinha.
Mas está mesmo enganada.
—Tem
sapo que se esgana com seu engano... ou com o acúmulo de enganos.
—Não
é o seu caso, amiga. O seu engano é nada mais do que um puxador de
conversa...
—Pois
diga, meu rei.
—Que
bonitinha!
—Não
se desvie e diga.
—A
humanidade dos sapos, a cada nova manhã, em todas as regiões do
mundo, está esperando, procurando, por essa amizade sincera e
transparente.
—Esperando?
—Procurando,
Sapabela, e “procurar”, no caso, é construir em si as condições
para o cultivo dessa amizade que virá... É edificar em si a ponte
por onde o amigo poderá atravessar sem temer o rio lodoso e
pantanoso das intempéries da vida e das vicissitudes do cotidiano...
—Rospo,
aposto em você!
—Como
assim?
—Aposto
na sua crença, e sei que um dia o mundo resplandecerá em harmonia,
amizade, delicadezas e festas...
—Festejar
é o que você mais gosta, amiga.
—Sim,
eu sou uma festa, Rospo, eu sou a humanidade do sapo, que nasceu para
a festa, para a alegria e para a luta pelas liberdades... Se a
humanidade dos sapos não consegue olhar para si, eu já estou bem
longe... E sei que esse tempo resplandecente virá... Mesmo que eu e
você já nos tenhamos ido...
—Sapabela,
você é preciosa...
—Rospo,
diga alguma novidade, só diz coisa que eu já sei.
—Não
me faça, ou melhor, faça-me rir.
—Querido,
que tal um licor de anis geladinho? Sem fazer aquilo.
—Yupiiii!
—Você
fez!...
—Foi
inevitável.
—Mas
eu adoro!
HISTÓRIAS DO ROSPO 2012 — 805
Marciano Vasques
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