—Sapabela, como vai?
—Vou nas asas da amizade sincera, do amor, da delicadeza, da ética. Como vê, vou alada.
—Interessante.
Estive pensando: não é justo o que você faz.
—Do
que está falando, Rospo?
—Ora,
Sapabela. Está querendo aumentar o índice de ataques cardíacos, de
AVC, de neuroses, de doenças somáticas, de...
—Espere
um pouco, meu amigo. Que estrepolia é essa? Não estou entendendo
nada...Excesso de labirintos quem gosta é Minotauro...
—Que
coisa maluca você falou, amiga. Não me faça, ou melhor, faça-me
rir.
—Então,
diga-me: que papo é esse de que eu sou uma causadora de doenças?,
fale, que a aflição já me pegou.
—Essa
sua aflição tem um nome: curiosidade. Quando eu era menino não
conseguia dormir quando me punha no travesseiro a pensar coisas que
precisavam de respostas...
—Eu
também, Rospo, fui uma sapinha perplexa diante da imensidão...
—O
que acontece é o seguinte: você é autêntica, é sincera, é fiel
aos amigos...
—Eu
sei, Rospo.
—Acredita
em seus sonhos e luta por eles. É, como diz, meio atrapalhada. Suas
roupas não combinam, você que vive dizendo isso.
—Meia
atrapalhada? Eu sou toda atrapalhada! Comigo não tem essa coisa de
“meio”. Ou você é na íntegra ou então...
—Pois
é. Vai à luta sempre. Tem alma de criança, consegue se emocionar e
chorar no cinema. Adora gargalhadas, e abraços, e …
—Está
mesmo falando de mim, Rospo? Conheço bem alguém assim.
—É
virtuosa, vive em retidão, não ilude ninguém, não é esperta,
adora ler, adora música, recorre à princesa chamada razão,
sempre, nas questões da vida, mas se desmancha no reino dos
sentimentos, vive cantarolando ...
—Agora
ele não para!...
—Está
sempre em paz e em harmonia, é incapaz de sorrir para quem maltrata
animal ou criança... Não suporta uma só injustiça... E é linda,
elegante...
—Vem
aí uma chuva de adjetivos...
—Você
é verdadeira, autêntica. Reparou como isso pode incomodar? Estamos
vivendo na época da superfície, da aparência. Alguém por demais
autêntico, que vive me virtude, que é feliz, alegre, é vaidosa, é
confiável, é forte, adora o vinho, o riso, a cantoria...
—Sim,
Rospo?
—Só
pode despertar ciúmes, inveja, esses sentimentos que só fazem mal
ao organismo de quem os alimenta. Quando alguém alimenta esses
sentimentos sinistros, a sua energia vai sendo sugada, e o sapo fica
sem proteção, e sujeito aos problemas que eu falei.
—Está
certo, Rospo. É interessante. Encontrei pela vida tantos sapos e
sapas canalhas, tantos sapos dissimulados..., uns de alma vazia, que
a esvaziou no desperdício de energia ocupando-se com o sucesso do
outro, em vez de sorrir e ser feliz ao ver que o sucesso de quem quer
que seja é fruto de esforço, dedicação, fibra, amor, e audácia,
e em vez disso, fica ali se remoendo, e conheci tantos sapos assim, e
também arrogantes,e que para ocupar espaço enganam o outro, isso
tem aos montes...
—Isso
tem a granel no mercado das aparências, minha amiga.
—Então,
Rospo, encontrei os piores caracteres, os “amigos” que
ludibriam, que enganam, que usam de artimanhas, de artifícios, de
safadezas para chegar lá, e …
—E?
—E
ao observá-los só acumulei forças para continuar a ser o que
sempre fui. Ou seja, a convivência com essas deformações da alma
só me levaram ao recolhimento de mim, e quando estive com a
Sapabela, compreendi, a cada nova manhã, que não importam os
desvios alheios, você só tem um ponto de partida: ser o que é.
Sempre!
—Sapabela,
vamos ao chocolate quente?
—Claro,
Rospo, antes o licor de anis.
—O
inverno com uma amizade sincera é bem aquecido.
—Acredite,
Rospo. Eu que sou privilegiada.
—Bondade
sua. Bem sabe o quando cresço a cada conversa.
—Rospo,
estou adorando o papo, mas o licor de anis está demorando.
—Nem
pedi ainda, Sapabela!
HISTÓRIAS DO ROSPO 2012 — 794
Marciano Vasques
HISTÓRIAS DO ROSPO 2012 — 794
Marciano Vasques
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