quarta-feira, 17 de outubro de 2012

UM LONG PLAY E ALGO MAIS

—Rospo! Manhã chuvosa! Viva! Yapo!
—Sapabela, que linda! Está indo à padaria Rubi?
—Sim, buscar o sonho da manhã. Sempre me ponho a pensar no que você disse certa vez, Rospo: Que um sapo precisa apenas de um Long Play em sua vida.

—Sim, e alguns bons livros, uma dúzia e meia, talvez...
—E uma dezena de filmes?
—Algumas dezenas, minha florista.
—Não trabalho mais na floricultura, Rospo!, bem sabe...
—Uma florista é para sempre, querida.
—Rospo, fico pensando: como é possível que muitas sapas aceitem apenas um fiasco de faísca na vida? Temos que intensamente viver sempre. O chamamento do amor é irmão do chamamento da felicidade.
—Amor causa dor e tristeza também, Sapabela.
—Rospo, isso é pura ilusão!, pura mentira, é lenda, é distorção do ARB...
—Que maluquinha sigla é essa, minha querida?
—Rospo, você me lembra quando estive certa vez em Alagoas, Maceió: eu perguntava para um caboclo de lá onde ficava tal rua e ele não me explicava.
—Não?
—Não, Rospo! Ele me levava, me acompanhava, e você me fez lembrar isso, pois está indo comigo até a padaria.
—A conversa sempre me puxa, querida, o laço dela é sedutor, além...
—Além do quê?
—A sua presença, a sua respiração, o seu esmalte, o seu vestidinho, hoje rosa... Os detalhes verdes...
—A chuva inspira, não é, meu amigo? Mas, que detalhes verdes?
—É... er... Mas, e a sigla?
—ARB? Amor Romântico Burguês. Ele padronizou alguns comportamentos, como faz a Psicologia em sua essência, e então, muitos acreditam que o amor cause tristeza e sofrimento, mas é o contrário: quando o amor está despido de chavões, clichês, ele, em sua natureza ou essência só trará felicidade.
—Difícil de assimilar isso assim repentinamente para um sapo leigo no amor como eu.
—O que disse?
—Adorei quando você falou que sapas aceitam fagulhas de migalhas, ou melhor, você disse, fiapo de, não, foi fiasco de faísca. Isso deveria ter sido deixado para um poema, mas já que preferiu a nossa conversa...Talvez um sapo, seja qual for, esteja precisando de uma ladra que ladrilhe a sua vida com poemas e aventuras...
—Uma ladra, com alma cigana,  que nos tome o porto, que nos lance nas agitadas águas das espumas do mar, que nos diga que a vida é muito mais do que aparenta, e ela sempre está no envidraçado fulgor de um azul transparente mesmo numa chuvosa manhã.
—Sapabela, um sapo precisa de algo mais do que apenas um Long Play em sua vida, alguns livros, uns filmes... Precisa de algo muito maior, mais intenso e mais imenso...
—Diga... Que algo é esse?
—Uma amiga com quem conversar numa chuva matinal.


HISTÓRIAS DO ROSPO 2012   — 834
Marciano Vasques


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