quarta-feira, 24 de julho de 2013

O FASCÍNIO DA TECNOLOGIA

—Rospo!
—Sapabela! Que surpresa! Noite fria, não é? E chuviscando...
—A noite ideal para ir até a Magnólia.
—Topo!
—Entre aqui. Sob o meu guarda-chuva cabe um bom amigo.
—Yupiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii!
—Que empolgação, Rospo!
—Sabia que havia sido uma boa ideia esquecer o meu.
—Muito engraçadinho. E então? Vamos nos entrelaçar numa conversa miúda, pois a Magnólia está chegando e logo mais irá fechar. Rospo, tenho um amigo que está desanimado da vida.
—Que coisa chata!
—Diz que quer morrer.
—Precisa avisá-lo...
—Avisá-lo?
—O inferno não suporta mais nenhum sapo.
—Rospo!
—É só brincadeira.
—Sei, está parecendo a Ponta da Praia da sua amiga.
—É...Mas se ele está desanimado com a vida, deve ir pra rua... Deve encontrar sapos e sapas, e ver a elegância da vida nas conversas vespertinas... E fazer amizade com a simplicidade...
—Tudo bem. A rua é uma inesgotável esperança de alegria...
—Sim, tem um sapo de diapasão, desses que amolam tesouras, precisa ver a voz desse sujeito. Parece a sonoridade da alma... Tem crianças brincando, correndo... Assim é a rua, pelo menos assim seria, "se essa rua fosse minha!"...
—Um outro amigo meu escreveu uma poesia do Eu...
—E então?
—Do eu a poesia.
—Estive pensando. É incrível o fascínio da tecnologia, da informática sobre os sapos. Ficam assim encantados, enfeitiçados. E fantástico tudo que a computação pode fazer. Veja os efeitos especiais do cinema, veja o tal fotoshop, veja como os sapos apreciam manipular as imagens... Mudar, dourar as imagens... Criam ilusões que enganam de tão semelhantes com a realidade.
—É incrível!
—Mas me pus a pensar: será que os sapos cultivam, regam diariamente, o olhar?
—Como assim, Rospo?
—Mil imagens, excesso de imagens, de ilusões, tudo muito fascinante, porém receio tenho de que o olhar esteja desaprendendo a ver, a se mirar, pois é para si o benefício do retorno, quando exercita a capacidade de ver, simplesmente ver, as coisas simples: uma flor, uma miosótis rompendo com a graminha no concreto da calçada, o sorriso de um sapinho... Já viu um sapinho sorrir?
—Fico imaginando que seja tão bonito quanto o sorriso de um sapão que eu conheço...
—Nem sabia que você amava um sapão!
—Rospo, eu falei isso?
—Ela chegou!
—Magnólia!
—Luzes despencam lilases e douradas, num aconchego de chuva de galáxias...
—Rospo, o frio está de tremer. Esse tremer roga pelo licor de anis.
—Yupiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii!

ROSPO 2013 — 886
Marciano Vasques

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